NOTA DA ADUNIR EM DEFESA DO CARÁTER LAICO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA – UNIR

No dia 11 de outubro de 2024, a comunidade acadêmica do Campus José Ribeiro Filho (Porto Velho) da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), foi surpreendida por uma movimentação estranha e sem qualquer manifestação por parte da Reitoria: espaços sendo ocupados, montagem de réplicas jurássicas e toda uma logística que causou certa estranheza.

A comunidade acadêmica, interpelando a reitoria por canais oficiais e extraoficiais, Prefeitura do Campus, ASCOM e outros integrantes da Administração Superior, só obteve um silêncio sepulcral.

Durante todo dia, enquanto imperava o silêncio e aumentavam as perguntas, os espaços de ensino, pesquisa e extensão foram sendo ocupados: barracas sendo montadas em salas de aula, chuveiros e cozinhas sendo instalados e até um “parque de dinossauros”.

A comunidade se perguntava: mas, por que o silêncio? Enquanto isso, um contingente superior de funcionários terceirizados agilizavam a limpeza, instalação elétrica e hidráulica, inclusive em período noturno.

Professores e estudantes perguntavam: será um evento acadêmico? Um Simpósio de Geografia
Agrária? Mas, o que seriam esses dinossauros? Não temos curso de paleontologia! O biólogo até se animou com a ideia, mas começaram a surgir grupos uniformizados, figuras caricatas que se
assemelhavam a guardas florestais de desenhos animados produzidos pela indústria de entretenimento do Tio Sam. Lembrou, inclusive, que o “inominável” estava vestido igual em uma aparição pública. Eram escoteiros de uma denominação religiosa.

Sem qualquer manifestação oficial, consultamos o Sistema Eletrônico de Informações (SEI), Processo nº 23118.007595/2024-98 e a verdade veio à tona: tratava-se de uma solicitação da igreja Adventista do Sétimo Dia (Ofício n 009/2024-ANRACAV) para a utilização do espaço físico da UNIR nos dias 11,12 e 13 de outubro, para um evento denominado “Aventuri”, que reúne os escoteiros organizados pela referida igreja por meio do “Clube de Aventureiros” e que pretendia reunir cerca de 2.000 participantes. No referido ofício, a igreja ainda solicitou, entre outros espaços, a utilização do Restaurante Universitário (RU), espaço conquistado com lutas históricas da comunidade acadêmica, sobretudo, os estudantes, nas greves e ocupações dos anos de 2008 e 2011 e 2023.

Por meio do Ofício nº 193 (1783931), a reitora Marília Pimentel autorizou o evento, cedendo o campus à Igreja Adventista nos seguintes termos: “Acreditamos que eventos como este são importantes para enriquecer a experiência educacional de nossos jovens, proporcionando oportunidades de aprendizado, troca de conhecimento e desenvolvimento cultural”. Em ato contínuo, nomeou o Vice-reitor Denny William de Oliveira Mesquita para coordenar e acompanhar o evento, sendo que o mesmo é membro do “Clube de Aventureiros”. Os espaços da UNIR estão sendo utilizados para promoção da sua igreja, sem falar no desrespeito desse coordenador aos núcleos e departamentos, atropelados e avisados de última hora sobre a atividade.

São problemas constantes do campus José Ribeiro Filho, as péssimas condições para atender a comunidade universitária: salas sem ar-condicionado ou sem manutenção, infestação de animais peçonhentos, falta de água e nuvens de mosquitos, para ficarmos apenas no corriqueiro e não adentrar outros problemas estruturais que precarizam as condições de trabalho de docentes e técnicos e contribuem para a evasão de estudantes.

Estes problemas, enfrentados no dia a dia, em que pese a reivindicação diuturna da comunidade, nunca foram solucionados. Mas, para atender a demanda externa, de uma entidade religiosa, negacionista da ciência, a Reitoria da UNIR envidou inúmeros esforços, inclusive o fumacê, para garantir as melhores condições de instalação dessa instituição obscurantista e a caturra denominada “desbravadores”.

Os estudantes do período noturno, no dia 11 de outubro, tiveram seus banheiros e salas de aula tomados pela multidão de evangélicos, num cenário em que se misturavam bandeiras verde-amarelas e dinossauros (alusivos à semana do criacionismo da referida igreja). Um desrespeito aos estudantes, professores e técnicos da instituição. O DCE/UNIR, em nota, já manifestou seu repúdio contra essa ação irresponsável da reitoria.

O Art. 19, inciso I da Constituição Federal estabelece que é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, estabelecer cultos religiosos, subvencioná-los, manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança. Contudo, não é isso que vemos hoje na UNIR. A reitoria “aventureira” da UNIR transformou um espaço laico de produção do conhecimento científico em um verdadeiro circo de difusão do negacionismo, obscurantismo e anticientificismo, aprofundando ainda mais seu caráter reacionário, oligárquico e umbilicalmente comprometido com o projeto de morte do latifúndio e da sociedade de classes.

Não se trata de um caso isolado. O Ofício Circular (SEI nº 1702071) emitido pela DGP/UNIR à varias unidades, confirma a simbiose entre gestão da UNIR e a supracitada entidade religiosa: a produção do Podcast da DGP o POD UNIR, nos estúdios ANRA (Associação Norte de Rondônia e Acre da IASD), pessoa jurídica da igreja adventista.

Repudiamos a realização dessa atividade de cunho religioso, orquestrado na surdina pela reitoria. Defendemos um Estado laico, a liberdade de crer ou não crer e de manifestação de diferentes religiosidades, mas nos templos, igrejas e outros espaços culturais. A universidade pública é laica, e cedê-la para atividades religiosas, fere sua natureza histórica e científica.

Abaixo o negacionismo e o obscurantismo na Universidade Federal de Rondônia!

Em defesa de uma Universidade laica e socialmente referenciada!

Que a ciência sirva ao povo!

Porto Velho/RO, 12 de outubro de 2024.

Diretoria da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Rondônia (ADUNIR)-Seção
Sindical do ANDES-SN